sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Em “A Ninhada”, o gesto ecológico

Professor Nivalson Miranda

Eu o conheci no mesão da Sala de Leituras da Adufpb, no Centro de Vivência da UFPB, nas costumeiras visitas matinais àquele ambiente de professores, antes ou depois de cada sala de aula. De hábito, um cumprimento de Bom dia! Primeiro, para a nossa abnegada Maria da Guia, sempre vigilante ao telefone e à portaria, não menos, a quem entra e sai no recinto. Em seguida, a mesma saudação aos quantos se encontram absortos na leitura de jornais e revistas, no interior da ampla sala de reuniões.
Ainda sem conhece-lo bem, via-o sempre mexendo em alfarrábios, rabiscos e desenhos, que sempre conduzia dentro de uma pasta presa com elástico. De outras vezes, confabulando com o também professor aposentado José Nilton, com quem sempre tive relações de trabalho acadêmico e na produção de cinema e vídeo.
Numa dessas vezes, fui apresentado a ele pelo amigo Nilton, que me dissera do interesse do seu velho companheiro, em registrar um trabalho de brasões genealógicos e outras estórias em filme. Desse contato, surgiu o meu prazer em conhece-lo. Expansivo, bem humorado, sempre com um “causo” novo para contar, aquele ex-professor de Física abordou-me como se já fôssemos íntimos havia anos. Gostei daquilo! Tempos depois, confidenciei a Nilton a minha simpatia pelo amigo que acabara de conhecer.
Com um entusiasmo quase ingênuo, o novo amigo passou-me às mãos algumas folhas de papel datilografado, dizendo ser o roteiro para um documentário que gostaria de realizar. Curioso fiquei com a construção daquele emaranhado de vocábulos e citações, que ele dizia ser um “roteiro”. Mas, tudo bem, já que se tratava de proposta interessante e em defesa da Ecologia, que o então abismado professor intitulara de “A Ninhada”.
A estória traçava o perfil de uma família pobre, com um garoto de pouco mais de dez anos, que residia na propriedade de um rico senhor de terras, numa região seca do cariri paraibano. Por ordem do patrão, o pai do menino, “Seu” Biu, fora orientado a tocar fogo na capoeira para o plantio de macaxeira e feijão. A questão era que, para fazê-lo, aos olhos do filho, toda a flora e fauna teria que ser devastada, para desespero da criança, que costumava subir nas árvores, brincar com os passarinhos e animais rastejantes que habitavam próximo à sua casa. Para o professor, na sua eloquente explanação, essa era a preocupante questão a ser tratada em “A Ninhada”. A reprovação, silenciosa, do filho ao que o pai teria de fazer no dia seguinte, queimando toda a extensão verde em derredor da casa em que moravam.
Disse-lhe, então: – Professor, vou estudar com bastante cuidado o assunto e nos falamos já na próxima semana.
Para o professor NIVALSON, autor daquela saga a ser documentada, o meu interesse pelo seu “roteiro” fora sintomático. Dissera ele ao professor Nilton, que tinha assistido às nossas conversas, quando retirei-me da sala da Adufpb.
Ato contínuo, viajamos em equipe para Serra Branca, cariri paraibano, onde criamos as locações adequadas para as gravações do vídeo. Resultado, de simples documentário terá sido “A Ninhada” um misto de ficcional e documental, com duração de doze minutos e ganhador do Prêmio de Melhor Curta-Metragem do V FestCine Digital do Semiárido, em 2012, para a direção de Alexandre Menezes, da AS Produções Cinema & Vídeo.
Esta semana, através da própria Adufpb, tivemos a lastimável notícia do passamento do nosso querido professor e amigo. Perde a Cultura, a Arte, a Heráldica, sobretudo, a família do ditoso professor NIVALSON MIRANDA, a sua permanente alegria e sua notória presença de espírito, especialmente nos debates que sempre promovia. Perde-se um homem para quem a própria idade avançada jamais significou um óbice à construção de algo sempre novo.

ALEX SANTOS - Professor e cineasta, Vice-presidente da Academia Paraibana de Cinema.
E-mails: alexjpb@yahoo.com.br / contato@asprod.com.br 

domingo, 18 de agosto de 2013

Festival gelado, com pouco calor do Nordeste

 "Tatuagem" de Hilton Lacerda (foto) Melhor Filme

Terminou nesse sábado (17), embaixo de chuva e ameaças de neve, a quadragésima primeira edição do Festival de Cinema Brasileiro e Latino da Cidade de Gramado, no Rio Grande do Sul. Não terá sido surpresa alguma o fato da quase inexistência de produções do Nordeste no festival. Salvo, de um único longa, “Tatuagem” de Hilton Lacerda, do vizinho Estado de Pernambuco. Mais uma vez a história se repete, quando produções selecionadas são mais do eixo Rio-São Paulo, onde os recursos “globalizados” existem mais gordos.
Afora esse aspecto, e da justa e bem intencionada Mostra Gaúcha deste ano, sempre coube ao Festival de Gramado um glamour todo especial. Glamour somente sentido por quem esteve participando alguma vez do importante certame. O Festival de Cinema é uma realização do Ministério da Cultura e da Prefeitura de Gramado, através de sua Secretaria de Estado da Cultura.
Quando lá estive, testemunhei a euforia e o apreço de toda cidade para com o seu mais importante acontecimento cinematográfico. Expectativa somente vista com a proximidade e os preparativos ao também cultural e glamoroso “Natal Luz”. Especial festa, que tem levado todos anos um considerável inúmero turistas às serras gaúchas.
No caso específico do Festival de Gramado deste ano, importantes homenagens foram prestadas. A começar pela coletiva que celebrou os 30 anos do filme de Hermano Penna "Sargento Getúlio". O ato contou inclusive com a presença do ator Lima Duarte, que fez questão de lembrar sua premiação trinta anos atrás, pelo filme no mesmo festival. O diretor também lembrou que nem tudo foi positivo na sua realização, lamentando os cinco anos que a Embrafilme, à época, se recusou a comprar a ideia do longa para sua distribuição.
Este foi, igualmente, o ponto da grande questão colocada este ano nos encontros e debates do festival. Como sempre, os reclamos não são poucos, quando se tratam de políticas públicas para a produção de filmes no país. De uma coisa temos certeza, mais ainda nos dias de hoje: Fazer Cinema não é, apenas, “brincar de vídeo”. Importante o que se tem feito sob a égide do aprendizado, contudo, ainda é muito pouco para um cinema que sempre careceu de uma, sequer, mínima indústria. E essa já provou que é rentável, inclusive em países onde o nível de vida, como é sabido, deixa muito a desejar. Como a Índia, por exemplo.
Cinema, no seu sentido clássico, maior, é continuidade... O que é do nosso empresariado brasileiro? Pouco ou quase nada eles têm contribuído, principalmente no Nordeste. Da parte dos governos existem esbanjamentos (id est) localizados na contribuição de uma simples experiência videográfica, através de programas e bônus institucionais a se perder no tempo.  
Existem as instituições de classe, mas pouco ou quase nada elas conseguem fazer. A Associação Brasileira de Documentaristas, que foi igualmente lembrada durante o evento de Gramado teve do presidente Jaime Lerner o destaque, no sentido e importância das entidades de cinema, afirmando: "Esse reconhecimento vem em um momento de profundas mudanças e transições na tecnologia e na política cinematográfica. Seria muito bom se o governo se desse conta de tudo. Enquanto isso ainda não acontece elas vão continuar necessárias, sim!".

Quiçá, seja esse o grave problema da produção cinematográfica brasileira, o do discurso do conformismo. O mais grave é constatar que, nessa orbe cinematográfica nordestina de ser, a questão da produção em cinema é ancestral, corriqueira. Não por falta de capacidade, mas de competência empresarial mesmo.

ALEX SANTOS é Vice-presidente da Academia Paraibana de Cinema.
E-mails: alexjpb@yaoo.com.vr / contato@asprod.com.br  

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Porque hoje é Dia dos Pais

 
"Seu" Severino do Cinema

Um atentado a bomba do IRA, em 1974, mata cinco pessoas numa localidade próximo de Londres. Um jovem rebelde irlandês e três amigos são acusados, presos e condenados pelo crime. O pai de um dos jovens tenta ajudar o filho e também é preso e condenado. Este é o tema do filme “Em Nome do Pai”, dirigido por Jim Sheridan e baseado na  autobiografia do próprio autor e personagem, o irlandês Gerry Conlon, que é interpretado por Daniel Day-Lewis, o mesmo que protagonizou “Lincoln” de Steven Spielberg.
Esta semana, revendo o filme de Sheridan, que trata com bastante acuidade e zelo da relação pai e filho, notadamente, quando se encontram presos na mesma cela, fiquei a imaginar como é importante uma paternidade conselheira e presente em nossas vidas. Uma relação de respeito e diálogo, ao buscarmos certas verdades e soluções para as questões do nosso próprio quotidiano.
À guisa de tais preocupações, sobretudo, em razão do que fomos e do que hoje somos, particularmente diria que, em respeito ao seu legado espiritual e familiar por mim assimilado e imitado – e não apenas cinematográfico –, rendo neste Dia dos Pais a minha irrestrita homenagem àquele que, durante anos soube exercer, pela arte-do filme, o encantamento através das imagens que projetou em écran luminoso e alimentando as nossas fantasias.
“Seu” Severino do Cinema, como era sobejamente conhecido na Cidade de Santa Rita e nos círculos profissionais da Cinematografia, dentro e fora do Estado, arresta hoje o Selo Patronal da Perpetuidade e do justo reconhecimento, em sua Academia. Selo igualmente estendido aos quantos que, como ele, fizeram do cinema a marca registrada, a saga venturosa de suas vidas em solo paraibano.
Pioneiro do “cinema mudo”, considerado também um estoico arquiteto e construtor de suas próprias salas de projeção, na cidade em que viveu e morreu, “seu” Severino do Cinema será nome sempre lembrado. Que os écrans luminosos dos nossos ruidosos projetores do passado, que tanto contribuíram na edificação das memórias e fantasias, que ainda hoje desfrutamos, continuem sempre a projetar as imagens de uma aventura virtual e mágica, e que doravante se imortalizem na guarda da nossa tão querida Academia Paraibana de Cinema.

Patrono da Cadeira 05, cuja indicação vem de ser o reconhecimento por toda uma vida dedicada à atividade cinematográfica, SEVERINO ALEXANDRE DOS SANTOS representa um dos pioneiros da Sétima Arte, na Paraíba. Seu empenho e estoicismo, desde os tempos em que o cinema ainda não tinha aprendido a “falar”, soube acalantar a fantasia e o devaneio de muitas gerações de cinemeiros. Hoje, duplamente imortalizado, principalmente para mim, seu filho, que já o tinha na condição de IMORTAL havia muito. Descanse em paz, meu Pai!

ALEX SANTOS é vice-presidente da Academia Paraibana, professor e cineasta, E-mails: alexjpb@yahoo.com.br / contato@asprod.com.br